domingo, 10 de dezembro de 2023

A NAT. HUM. SDO. FREUD E ROGERS

 

A Natureza Humana Segundo Freud e Rogers


Sigmund Freud (1856-1939), foi um médico neurologista, psiquiatra, professor, pesquisador, escritor premiado e criador da psicanálise.

O arqueólogo do inconsciente. Freud nasceu em uma família judaica, em Freiberg in Mähren, na época pertencente ao Império Austríaco (atualmente, a localidade é denominada Příbor, e pertence à República Tcheca).


A natureza humana e a civilização em Freud 

Freud sempre esteve interessado pelas questões referentes ao reflexo psicológico do homem na cultura, isto é, buscou compreender até que ponto a civilização se reveste dos aspectos inerentes à porção psíquica do homem. Com esse propósito, Freud escreveu duas obras, nas quais privilegia a discussão sobre esse tema. São elas, O futuro de uma ilusão, de1927 e O mal-estar na civilização, de1930. 

Na primeira Freud trata do paradoxo que há entre o empenho do homem em construir e levar avante a civilização e a sua hostilidade para com ela, a ponto de ser preciso defendê-la de seus próprios impulsos hostis. Explica-nos que deve-se “...levar em conta o fato de estarem presentes em todos os homens tendências destrutivas e, portanto, antissociais e anticulturais...” quando se aborda essa questão, assim como o fato de que a civilização ergue-se às custas da coerção e da renúncia à satisfação pulsional. Os sacrifícios pulsionais exigidos pela civilização proíbem, frustram e privam o sujeito de satisfações que, de outro modo, poderiam ser obtidas. Por serem “preguiçosas e pouco inteligentes”, às massas não se pode dispensar a coerção, sendo necessário um líder para dirigi-las, na pessoa de alguém que tenha alcançado uma compreensão e um domínio maiores quanto às necessidades da vida.

A segunda obra de Freud que nos interessa é O mal-estar na civilização de 1930. Esta dá prosseguimento às questões presentes no texto citado anteriormente sobre o propósito da vida, o papel da religião e o preço a pagar por estar inserido na sociedade. O antigo paradoxo ainda o acompanha. Ele diz: “... nossa civilização é em grande parte responsável por nossa desgraça e que seríamos muito mais felizes se a abandonássemos e retornássemos às condições primitivas. Chamo esse argumento de espantoso porque, seja qual for a maneira por que possamos definir o conceito de civilização, constitui fato incontroverso que todas as coisas que buscamos a fim de nos protegermos contra as ameaças oriundas das fontes de sofrimento, fazem parte dessa mesma civilização.” Constata que o homem busca a felicidade e o prazer, encontrando, porém, um mundo claramente em desacordo com um tal estado de felicidade. O princípio do prazer “...domina o funcionamento do aparelho psíquico desde o início. Não pode haver dúvida sobre sua eficácia, ainda que o seu programa se encontre em desacordo com o mundo inteiro, tanto com o macrocosmo quanto com o microcosmo. Não há possibilidade alguma de ele ser executado; todas as normas do universo são-lhe contrárias. Ficamos inclinados a dizer que a intenção de que o homem seja feliz não se acha incluída no plano da Criação.” 

Freud não esconde seus temores quanto ao futuro da humanidade e ao final de seu texto O Mal-estar na civilização, nos diz: “A questão fatídica para a espécie humana parece-me ser saber se, e até que ponto, seu desenvolvimento cultural conseguirá dominar a perturbação de sua vida comunal causada pela pulsão humana de agressão e autodestruição. (...) Os homens adquiriram sobre as forças da natureza um tal controle que, com sua ajuda, não teriam dificuldades em se exterminarem uns aos outros, até o último homem. (...) Agora só nos resta esperar que o outro dos dois ‘Poderes Celestes’, o eterno Eros, desdobre suas forças para se afirmar na luta com seu não menos imortal adversário. Mas quem pode prever com que sucesso e com que resultado?” (1).

A natureza humana segundo Freud 

O modelo de homem apresentado pela psicanálise pode ser resumido nos seguintes termos, de acordo com Kline (1988): 

O homem tem dois impulsos principais: sexualidade e agressão, juntos com motivos determinados pelo meio ambiente, tais como os conflitos de Édipo e de castração, que exigem expressão. Uma vez que estes operam um sistema de energia fechado, a expressão é vital. Através da mediação do ego em defesas bem e malsucedidas a expressão direta e indireta, na forma de sintomas neuróticos e atos simbólicos, é conseguida. Este modelo de homem necessita de um alto grau de controle na sociedade e saídas institucionalizadas para os impulsos. Sem esses, de acordo com o modelo freudiano, viveríamos de forma arriscada (p.143). 

Freud considera, na sua teoria, a pulsão de vida e a pulsão de morte como faces da mesma moeda, dando a entender que eros e tanatos têm o mesmo peso. Todas as duas formas de energias transitam livremente no inconsciente, cujo único objetivo consiste em aliviar suas tensões, segundo o princípio do prazer e de acordo com o processo primário. Para ele, o homem é possuidor de um permanente conflito entre forças antagônicas existentes em seu interior.

A hostilidade humana, ao que tudo indica, não tem limites: o homem é hostil não só a sociedade como também a seus companheiros mais próximos. É, pelo menos isso, o que nos afirma Freud no trecho abaixo: 

A sociedade civilizada está perpetuamente ameaçada pela desintegração por causa dessa hostilidade primária dos homens entre si... A cultura tem de recorrer a todo reforço possível a fim de erigir barreiras contra o instinto5 agressivo dos homens... Daí... seu mandamento ideal de amor ao próximo como a si mesmo ser realmente justificável pelo fato de que nada está tão completamente em desacordo com a natureza humana original. (Freud (1930), cit. por Walker, 1957, p.3).

A natureza humana segundo Rogers

Carl Rogers (1902-1987) foi um psicólogo americano atuante na terceira força da psicologia e desenvolvedor da Abordagem Centrada na Pessoa. Sua dedicação à construção de um método científico na psicologia, foi reconhecido por prêmio da Associação Americana de Psicologia, da qual também foi eleito presidente, em 1958, tendo sido um pioneiro no estudo sistemático da clínica psicológica.

A primeira força a Psicanálise, seguida da Psicologia comportamental, a terceira a Psicologia humanista e a quarta força, a Psicologia Transpessoal.

Ao estudarmos a teoria rogeriana, nos deparamos com um posicionamento bastante diferente daquele que vimos quando estudamos a teoria freudiana, no que se refere a natureza humana. Nela destaca-se a grande confiança que Rogers sentia pelo homem. Confiança, esta, que pode, à primeira vista, parecer ingênua, mas que é fruto de uma larga experiência clínica e comunitária, amplamente embasada e demonstrada através de gravações em tapes e filmes, além de resultados de pesquisas realizadas por ele e por seus colaboradores, em várias partes do mundo. 

A grande crença que ele sentia na capacidade do indivíduo é, assim, enunciada: "O ser humano tem a capacidade, latente ou manifesta, de compreender-se a si mesmo e de resolver seus problemas de modo suficiente para alcançar a satisfação e eficácia necessárias ao funcionamento adequado" (Rogers & Kinget, 1977, p.39).

A concepção de uma natureza "angélica" do homem, atribuída a Rogers, encontra-se, portanto, bem longe da verdade. 

Não possuo visão ingênua da natureza humana. Tenho bem consciência de que para se defender e movido por medos intensos, indivíduos podem e, de fato, se comportam de modo incrivelmente destrutivo, imaturo, regressivo, anti-social e nocivo (Rogers, 1961, p.27). 

Mas a compreensão de Rogers a respeito da natureza humana vai além dessa constatação: 

Contrariamente à opinião que vê os mais profundos instintos do homem como sendo destrutivos, observei que, quando o homem é, verdadeiramente, livre para tornar-se o que ele é no mais fundo de seu ser (como no clima seguro da terapia), quando é livre para agir conforme sua natureza, como um ser capaz de perceber as coisas que o cercam, então ele, nitidamente, se encaminha para a globalidade e a integração. Como já disse em outra publicação (Rogers, 1961, p.105): (Quando o homem) é de todo um homem, quando ele é o seu organismo completo, quando a apercepção da experiência, esse atributo peculiarmente humano, está operando na sua máxima plenitude, então se pode confiar nele, então seu comportamento é construtivo. Nem sempre será convencional, nem sempre será conformista. Será individualizado. Mas será também socializado (Rogers, in Burton, 1978, p.195). 

Apesar de sua grande confiança no homem, Rogers sabe que somente consciente dos fatos que o cercam, poderá o indivíduo tomar decisões acertadas. E preocupa-se ante a consciência de que a nossa sociedade, na pele dos políticos, dos funcionários do governo, da indústria, da extrema direita e da extrema esquerda, entre outros, estejam todos empenhados em esconder os fatos (Cf. Rogers, in Evans, 1977). Ao longo de sua experiência, ele constatou que muitos dos sentimentos, considerados positivos, como o amor, a confiança e a bondade são, muitas vezes, aqueles mais profundamente recalcados, e não somente aqueles impulsos socialmente proibidos (2). 

Conclusão

A pós-modernidade é marcada profundamente pela ciência e pela tecnologia. A engenharia genética, a engenharia aeroespacial e a neurociência. Pela neurociência temos a abissal configuração da mente e do cognitivo do indivíduo. A simbiose da natureza humana é conhecida em todos os seus contextos: da antropologia, sociologia, neuropsiquiatria, a fisiologia do cérebro e de suas funções, sejam o comportamento, pensamento (psique) ou os mecanismos de regulação orgânica e interação psicossocial alguns problemas se impõem aos pesquisadores, destacando-se entre estes os que podem ser reunidos pela patologia. A dimensão humana foi decifrada.

Dr. A. Inácio José do Vale

Psicanalista Clínico, PhD

Capacitado em Psicologia Clínica

Professor no Centro Educacional Católico Reis Magos

Membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise Contemporânea/RJ.  

 

Notas e Bibliografia

 

(1)   Citação de Dra. Leyserée Adriene Fritsch Xavier, Psicóloga Clínica e especialista em psicanálise. 

(Cf.:http://www.psicanaliseefilosofia.com.br/adverbum/Vol3_2/03_2_7natureza_humana_kant_freud.pdf).

 

(2) Citação de Dra. Sonia Maria Lima de Gusmão, especialista em Psicologia Clínica, Psicodrama Triádico, e Gestalt-terapia de Grupo. 

(Cf.: https://gruposerbh.com.br/textos/artigos/artigo22.pdf).

 

KLINE, P. Psicologia e Teoria Freudiana, Imago, Rio de Janeiro: 1988. 

FREUD S. (1933 [1932]) Novas Conferências Introdutórias Sobre a Psicanálise, Imago, Ed. STANDARD Brasileira, Rio de Janeiro: 1976, vol. XXII. 

________ (1900-1901) A Psicopatologia da Vida Cotidiana - Imago, Ed. STANDARD Brasileira, vol. VI, Rio de Janeiro: 1976.

_________ (1930) Mal-Estar na Civilização. Imago, Peq. Col. da Obra de Freud, Livro 8, Rio de Janeiro: 1974. 

EVANS, R. Carl Rogers. O homem e suas ideias. Martins Fontes, São Paulo: 1979.

ROGERS, C. R. Tornar-se Pessoa, Martins Fontes, Lisboa, 1974, 2ª ed.

_________ Um Jeito de Ser, EPU, São Paulo: 1983.

__________ Uma Nota Sobre a Natureza do Homem. (Universidade de Chicago), 1957, in Walker, Carl Rogers e a Natureza do Homem - Apostila.

ROGERS, C. R. & KINGET, G. M. Psicoterapia e Relações Humanas. Interlivros, Belo Horizonte: 1977, 2ª ed. vol. I, II)

WALKER, Donald.  Carl Rogers e a Natureza do Homem. (San Diego State College) - Apostila.

 

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