quinta-feira, 19 de outubro de 2023

A DEPRESSÃO ENTRE OS JOVENS

 

A DEPRESSÃO ENTRE OS JOVENS


“A depressão é a incapacidade de construir um futuro”.


Dr. Rollo Reece May 


Psicólogo e escritor americano 



Uma das instituições mais respeitadas do mundo, a Sociedade Americana de Pediatria divulgou novas recomendações em torno dos distúrbios da mente: os médicos devem considerar e avaliar a possibilidade de depressão em todos — todos! — os pacientes jovens, mesmo naqueles mal saídos da infância, que passam por consultas de rotina. Até então, a indicação era investigar apenas os que apresentassem riscos mais evidentes, que tivessem atravessado traumas ou que possuíssem parentes com episódio severo de depressão.


A prevalência da depressão entre jovens é acachapante. Nos últimos cinco anos, a incidência entre homens e mulheres de 12 a 25 anos teve um salto de quase 40%. Nas outras faixas etárias, o índice caiu (veja o quadro na pág. 82). Foi isso que mostrou um estudo realizado com 600 000 pessoas, conduzido pela Universidade Colúmbia, nos Estados Unidos. O resultado é aplicado aos americanos, evidentemente, mas se repete em quase todo o Ocidente. No Brasil, estima-se que 10 milhões de meninas e meninos sejam acometidos por ao menos uma crise de depressão ao longo da juventude. Não se devem interpretar os dados supondo que, do dia para a noite, os casos tenham explodido. Na verdade, sabe-se com certeza que houve um aumento de notificações de casos depressivos, o que deve ser resultado de dois fenômenos simultâneos: o maior cuidado com os jovens e o aumento real da incidência da depressão entre eles.


As redes sociais


Mas o que há hoje que não havia antes para arrastar tantos jovens para a tristeza sem fim? É uma resposta difícil, mas a ciência já trabalha com algumas hipóteses. A professora de psicologia Jean Twenge, da Universidade San Diego, autora de dois pequenos clássicos sobre os efeitos da tecnologia no comportamento da sociedade, Generation Me e iGen, arrisca uma pergunta provocadora e entrega uma resposta cuidadosa mas preocupante: “Os smartphones destruíram uma geração?”. A resposta: “Talvez sim”. Soa paradoxal, mas na era das redes sociais, em que tudo é compartilhado o tempo todo, os adolescentes talvez jamais tenham estado tão sós — escondidos atrás dos dois sinaizinhos azuis do WhatsApp. “O mundo está repleto de situações que contribuem para a depressão, em especial para os mais novos”, afirma Luciana Sarin, psiquiatra do Programa de Doenças Afetivas da Universidade Federal de São Paulo. “É um movimento novo, que pede atenção.” Os adolescentes acordam, dormem, comem, estudam, vão para a festa e ao banheiro, tudo sempre de olho no celular — quando recebem respostas rápidas, está quase tudo bem, o diálogo prossegue acelerado, com emoticons, frases picotadas etc. A vida segue sua toada, 100% conectada. O silêncio e a demora, os bastões do WhatsApp apagados, no entanto, são sinônimo de eternidade e ansiedade, muita ansiedade. “O uso abusivo de smartphones favorece os sintomas da depressão”, diz Pedro Pan, psiquiatra e pesquisador da Universidade Federal de São Paulo.


Estudos comportamentais e biológicos já esclareceram que a ansiedade serve como alimento para os processos depressivos, a partir da ação do cortisol, hormônio liberado quando há estado de atenção e alerta. O stress crônico prejudica as conexões cerebrais, favorecendo a depressão. Um levantamento da Universidade Duke, dos Estados Unidos, apontou a relação direta do uso abusivo das novas tecnologias com a depressão. Os pesquisadores acompanharam, durante um ano e meio, o dia a dia de uma centena de adolescentes com idade entre 11 e 15 anos, diagnosticados como potenciais portadores de transtornos ligados à saúde mental, como a depressão. Os participantes que usavam tecnologias digitais por mais de duas horas e meia por dia tendiam a exacerbar comportamentos associados à depressão. Quando a exposição era menor, o uso dos aparelhos operava no sentido contrário: ajudava a diminuir os sinais de angústia.


O tratamento

Os desafios impostos à medicina para o controle da depressão também resultam da complexidade da própria doença. Suas origens biológicas e suas causas ainda não foram totalmente desvendadas. O mundo moderno, evidentemente, não é o único problema — e, aqui, relembre-se a primeira parte da suposição do psiquiatra alemão Kurt Schneider, a depressão endógena. O papel dos genes é essencial. A predisposição genética é responsável por seis em cada dez casos do transtorno. Mais: alguém que tenha o pai ou a mãe vítima do problema apresenta um risco 40% maior de também desenvolver depressão.


O tratamento para a depressão na adolescência é o mesmo dos adultos: psicoterapia e medicação. A grande diferença na constituição da doença nos jovens está na manifestação de seus sintomas. Os mais velhos tendem a sentir desinteresse, falta de energia, tristeza, prostração. Os jovens portadores do transtorno, pela fase de intensa transformação cerebral, costumam reagir de forma mais ansiosa, com irritação, mas sem perder a energia. O sofrimento é menos visível. Eles se trancam no quarto, manifestam raiva. Irritam-se com pequenos imprevistos — mas vão a festas, de onde só pensarão em ir embora. Jogam videogame, mas sem prazer. Alguns continuam indo para a escola, embora as notas tendam a cair. É comum entre os pais chamar a adolescência de “aborrecência”, numa alusão ao adolescente que parece viver de cara amarrada, mas talvez esse seja um sintoma depressivo que merece ser relatado ao médico.


Cyberbullying é agressão ocorrida no ambiente das novas tecnologias. “O jovem pode estar ao lado do pai no carro, na sala, em qualquer lugar, e sofrendo bullying ao mesmo tempo pelo celular”, diz Márcio Bernik, psiquiatra e coordenador do Programa de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria da USP. É como se a humilhação fosse carregada no bolso.


Tudo somado entende-se por que a nova medida da Sociedade Americana de Pediatria é imperativa: que, nas consultas médicas de rotina, o adolescente, todo adolescente, seja avaliado sobre a possibilidade de estar em depressão. Os riscos hoje são maiores do que no passado (1).


Conclusão


A depressão é a segunda causa de morte de jovens entre 15 e 29 anos. Segundo recente estudo (*) da Organização Mundial da Saúde (OMS), – cerca de 15% dos brasileiros sofrem com distúrbios depressivos e de ansiedade;– cerca de 16% dos jovens no mundo, entre 15 e 29 anos, sofrem com distúrbios depressivos e de ansiedade.


A pessoa depressiva pode não saber procurar ajuda e muitas vezes nem sabe como obter auxílio profissional. A impotência diante dessa patologia é tão grande que o indivíduo não tem energia ou vontade sequer para realizar tarefas diárias simples como se alimentar bem, conversar, tomar banho, sair para o trabalho, quanto mais procurar ajuda. Dentro desse contexto é urgente procurar ajuda dos profissionais da saúde mental.


As redes sociais aproximaram os mais distantes e afastou os mais próximos. Para ambos o silêncio, as palavras e as imagens são sepulcrais.

Nada pode substituir o contato físico, a comunhão familiar, a amizade dos amigos, as brincadeiras sadias, o barulho das gargalhadas, tudo isso ao vivo e a cores, em encontros reais fundamentados no amor, afeto e carinho para solidificar o bem-estar físico e emocional.


Dr. A. Inácio José do Vale

Psicanalista Clínico, PhD

Professor e Conferencista

Membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise Contemporânea/RJ. E da Ordem Nacional dos Psicanalistas/RJ.

Fontes:

(1) https://veja.abril.com.br/revista-veja/as-dores-do-crescimento/

(*) Depression and Other Common Mental Disorders, World Health Organization, 2017.

Nenhum comentário:

Postar um comentário